16.8.11

Valor Econômico - Livros

Sucessão:
Famílias que cultivam valores fazem empresas de vida mais prolongada
Olga de Mello Para o Valor, do Rio
24/05/2011Text Resize
Texto:-A +A ...CompartilharImprimirEnviar por e-mail .."Empresas Centenárias"
Renato Bernoheft, com Chris Martinez. Agir. 152 págs., R$ 49,90

Pai rico, filho nobre, neto pobre? Nem sempre o ditado popular é regra, afirmam Renato Bernhoeft e Chris Martinez, autores de "Empresas Centenárias", que analisa a trajetória de cinco companhias brasileiras que há mais de cem anos permanecem sob o controle das famílias de seus fundadores. Fundador da Höft, consultoria especializada em transição familiar, Bernhoeft observou pontos comuns na gestão das empresas de diferentes portes e atividades selecionadas para seu estudo: "À parte peculiaridades ligadas até ao gênero de negócio, todas garantiram a própria longevidade ao cuidar de, mais do que garantir herança, difundir valores e criar uma cultura sobre o trabalho que geram. As empresas que enfocamos guardam registros históricos desde a época de sua fundação, editaram livros, montaram arquivos fotográficos e, quatro delas, criaram até museus abertos ao público".

O livro traz a história do Grupo Gerdau (Rio Grande do Sul), da Sul América de Seguros (Rio de Janeiro), da Cedro Têxtil (Minas Gerais), da Ypióca (Ceará) e da paulistana Casa da Bóia. "Comparada às outras empresas, a Casa da Bóia é minúscula, tem apenas uma loja, a primeira de ferragens no Brasil, que continua funcionando no mesmo casarão desde sua fundação. No entanto, é um exemplo de sucesso de empreendimento comandado pela mesma família há 120 anos", afirma Bernhoeft.

Além de valorizar a experiência e o sucesso das empresas familiares brasileiras, o livro foi planejado de forma a estimular o estudo em torno do tema, visto ainda com "preconceito" no país, diz Bernhoeft. Responsável pela pesquisa sobre a história das famílias, a jornalista Chris Martinez lamenta a escassez de investigações sobre referências nacionais no campo empresarial. "Nosso olhar, geralmente, é para os exemplos de sucesso que ocorrem fora do Brasil. Conhecer a história dessas empresas é entender o nosso próprio processo de formação industrial."

Estudiosos de administração apontam o aumento da longevidade humana como um dos fatores a contribuir para a redução da expectativa de controle das famílias sobre as empresas que fundam. No Brasil, os dados sobre o número de empresas familiares são imprecisos, reconhece Bernhoeft, que, no entanto, não acredita no declínio desse gênero de formação societária. O presidente do Grupo Gerdau, Jorge Gerdau Johannpeter, lembra, no prefácio do livro, que empresas com controle familiar têm rentabilidade de 10 a 15 % superior à média. Para Johannpeter, a explicação estaria na conjugação de gestão profissional com visão estratégica de longo prazo. Segundo Bernhoeft, outro fator de sucesso seria a habilidade para enfrentar conflitos de família - causa do fim de 70% das empresas familiares.

"Na Europa, onde existem famílias que estão à frente de negócios por mais de 200 anos, percebe-se preocupação com a preparação de herdeiros - como acontece nas empresas centenárias brasileiras que continuam sob comando da família fundadora. À medida que a família se amplia, é essencial compreender que heranças podem se dissipar, enquanto valores éticos perpetuam o negócio e formam dinastias", observa Bernhoeft.

A perda de controle acionário não acontece na segunda geração da família do fundador, mas a partir da terceira, geralmente, quando o número de herdeiros aumenta. "A segunda geração, geralmente, sofre outro tipo de pressão, a de mostrar-se tão capaz quanto os pais. É muito difícil ser filho de um homem brilhante, até porque os fundadores, devido à dedicação exigida por suas atividades, podem tornar-se pais muito distantes. Daí a importância de entender a empresa acima do que ela possa gerar em dinheiro", diz Bernhoeft.

Uma característica comum às empresas centenárias sob controle familiar é que, mesmo mantendo a participação acionária dos herdeiros, boa parte deles busca reduzir o grau de dependência daquele negócio. "As empresas começam, geralmente, com um fundador, às vezes associado a um irmão ou primo. A segunda geração, de primos, nem sempre conseguirá alocar-se em cargos dentro da companhia. A terceira, então, ficará mais distanciada ainda dos processos decisórios. É importantíssimo que esses herdeiros não olhem a empresa como sua única alternativa de vida."

Preservar os espaços da família e dos negócios é fundamental, embora dificilmente essas famílias consigam superar traumas como separações. "Ex-genro não consegue trabalhar para sogro, assim como primos brigados não se sentam na mesma mesa. As questões emocionais pesam em todos os campos. A família tem uma dinâmica própria. Ninguém coloca um excelente gestor à frente da empresa se ele se dá mal com os parentes, que são acionistas", conclui Bernhoeft.

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