28.8.07

Valor Econômico - Livros (2006)

Atentados lotam as prateleiras das livrarias
Olga de Mello, para o Valor
11/08/2006




Um tema ainda timidamente explorado pela ficção literária, os atentados terroristas nos Estados Unidos em 11 de setembro de 2001, provocou uma previsível avalanche de publicações que analisavam os ataques sob os mais variados aspectos. Ao lado de títulos que privilegiavam os feitos heróicos no resgate das vítimas do World Trade Center, ensaios sobre as conseqüências políticas das ações terroristas disputavam espaço nas prateleiras das livrarias.


Se atualmente as análises sócio-políticas continuam predominando na literatura sobre o 11 de setembro, pouco a pouco, os atentados e os traumas que causaram em todo o mundo são aproveitados pela ficção, enquanto os acontecimentos daquela terça-feira em que o mundo parou também ganham novos relatos por perspectivas diferentes.


Um desses novos ângulos é explorado pelo brasileiro Ivan Sant'Anna em "Plano de Ataque" (Objetiva), que acaba de chegar às livrarias. Ao ver a imagem do choque do primeiro avião contra uma das torres do World Trade Center, Sant'Anna, mais do que perplexidade, sentiu que ali estava a "maior história da aviação moderna" a ser contada. No ano anterior, havia sido lançado seu livro de maior sucesso, "Caixa-Preta", sobre três episódios com aviões brasileiros - dois desastres e um seqüestro. Sant'Anna debruçou-se sobre o relatório da comissão americana que investigou os ataques de 11 de setembro, leu 30 livros e escreveu 17 mil páginas, das quais restaram no livro apenas 270.


"Meu interesse era mostrar a história de quem estava nos aviões, entre tripulação, passageiros e seqüestradores. Ouvi gravações de caixas-pretas, de telefonemas de passageiros, das conversas entre aeromoças e controladores de vôo. Não há qualquer criação ficcional no livro. É uma reportagem com uma grande carga emocional, pois aquela gente toda morreu. Meu cuidado foi o de ser o mais isento possível, a ponto de evitar o uso de palavras como 'herói' ou 'terrorista'. Preferi chamar os seqüestradores de kamikazes", diz Sant'Anna.


No campo da ficção, outro autor brasileiro, Jorge Furtado, já havia utilizado o 11 de setembro como elemento que assinala diferenças culturais e separa amantes em "Trabalhos de Amor Perdidos", uma recriação livre sobre peça de William Shakespeare. A reflexão e o temor crescente que os atentados trouxeram permeiam narrativas de diversos escritores, como Ian McEwan ("Sábado") e Monica Ali ("Brick Lane").


Os ataques já foram aproveitados como referência em um policial de Michael Connelly, no thriller de William Gibson "Reconhecimento de Padrões" e no conto de ficção científica "Em Espírito", de Pat Ford. A novidade nas prateleiras brasileiras é a abordagem direta sobre a dor da perda e as tentativas de recuperar o passado em "Extremamente Alto e Incrivelmente Perto" (Rocco), de Jonathan Safran Foer.



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Também escritores brasileiros, como Ivan Sant'Anna e Jorge Furtado, abordam o episódio de 11 de setembro de 2001 em suas obras
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O jovem protagonista Oskar é um menino de 9 anos que procura desvendar um mistério relacionado a seu pai, morto no desabamento do World Trade Center. Repleto de fotografias e páginas com reproduções de manuscritos, não há revolta nos personagens do romance, apenas uma tristeza profunda. Paralelamente às aventuras de Oskar, que corre por Nova York, conhecendo adultos que, ele acredita, irão aproximá-lo do pai, estão as recordações de seus avós sobre o bombardeio de Dresden, na Alemanha, pelos aliados, na Segunda Guerra.


As diferentes definições do que são crimes de guerra e como a classificação varia, dependendo do lado que julga a ação, é um dos focos de Noam Chomski em "Ambições Imperiais - O Mundo pós-11/9" (Ediouro), que estará nas livrarias até o fim do mês. Na série de entrevistas concedidas a David Barsamian, Chomski ataca a política de George W. Bush e recorda que a parcialidade no enfoque da guerra pode ser comprovada pelos padrões adotados pelo Tribunal de Nuremberg para julgar os crimes dos nazistas durante a Segunda Guerra. Ele lembra que, responsáveis pelos "devastadores bombardeios de centros urbanos civis, como Tóquio e Dresden", as forças aliadas tiveram suas ações minimiza-das no julgamento: "Como os aliados bombardearam muito mais do que o Eixo, esses bombardeios foram retirados da categoria de crimes de guerra". Crítico contumaz da "doutrina Bush", Chomski afirma que os pretextos para a invasão do Iraque "não são mais convincentes que os de Hitler".


Na mesma linha, chega às livrarias no fim do mês "Insegurança Total - O Mito da Onipotência Americana", da jornalista Carol Brightman, que compara a invasão do Iraque à participação dos Estados Unidos no Vietnã. Para Brightman, o poder ilimitado, a corrupção corporativa e a vulnerabilidade política são marcas do governo Bush. No livro, ela analisa as maneiras pelas quais a obsessão pós-11 de setembro com segurança deflagrou uma economia de guerra planejada por estrategistas conservadores. Carol Brightman adverte para a ascensão do nacionalismo iraquiano - que teria sido fomentada pela ação dos Estados Unidos naquele país -, enquanto aponta a relação próxima entre indústria, governo e militares, e adverte para o perigo da contratação de mercenários como empregados de indústrias que estão no Iraque.


Outro lançamento da Record é "Crônicas da Era Bush: O que Ouvi sobre o Iraque", do renomado ensaísta e crítico literário americano Eliot Weinberger. Organizado cronologicamente, o livro traz textos escritos no dia seguinte aos atentados, três semanas depois, um mês mais tarde, até chegar a completar um ano e meio após os ataques. Originalmente publicada na revista "London Review of Books", a aclamada crônica "O que Ouvi sobre o Iraque" traz notícias a respeito do Iraque e de Saddam Hussein a partir de 1992, quando os Estados Unidos se congratulam por não haverem tomado o governo durante a Guerra do Golfo. As modificações no discurso oficial que deveria legitimar a invasão do Iraque perante o mundo são mostradas sem qualquer consideração pessoal por Weinberger, que fez uma nova versão da crônica em 2005.


No início de setembro, a Zahar lança "Poder, Terror, Paz e Guerra", uma visão sobre as relações externas dos Estados Unidos depois dos atentados de cinco anos atrás. O autor, Walter Russell Mead, propõe que Bush modifique sua posição em relação aos conflitos entre Israel e os palestinos, e que procure formas para reconquistar o apoio da população dentro dos Estados Unidos.

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